Previsão anterior era de que rejeitos chegassem ao rio São Francisco entre os dias 15 e 20 de fevereiro. Rompimento de barragem em Brumadinho ocorreu na última sexta. Foto: Divulgação.
O desastre do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG) pode atingir a bacia do Rio São Francisco, segundo pesquisadores da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj).
Um estudo sobre como diminuir no Nordeste o impacto da água contaminada pelos rejeitos é desenvolvido por essa instituição federal de pesquisa científica, em parceria com universidades brasileiras e Universidade de Toulouse, na França.
De acordo com Neison Freire, pesquisador com pós-doutorado em risco de desastres naturais, os metais pesados presentes na lama devem migrar do leito do Rio Paraopeba para o Rio São Francisco, mesmo com o sacrifício da Usina Hidrelétrica Retiro Baixo, sinalizado pelo governo federal.
Para o estudo, são usadas imagens captadas pelo satélite francês Sentinel, que consegue detectar objetos de, no mínimo, cinco metros de comprimento. O equipamento também permite a visualização da área atingida a cada cinco dias.
Lama não deve chegar ao rio São Francisco, aponta novo boletim do Serviço Geológico.
Em um boletim divulgado na noite da segunda-feira (28), o Serviço Geológico do Brasil afirma que não há possibilidade de a lama de rejeitos da Vale chegar à Usina de Três Marias, no Rio São Francisco. Para a Fundaj, no entanto, o problema não para por aí.
Neison explica que, com a desativação das turbinas de Retiro Baixo, a lama pode, sim, ficar restrita ao reservatório, mas, em algum momento, a barragem precisará verter.
“A lama que chegar em Retiro Baixo vai sedimentar, mas a barragem precisa sangrar para que ela não rompa. Daí, não temos como impedir que a água do Rio Paraopeba chegue no São Francisco, pela Usina de Três Marias. A contaminação afeta os três principais usos da água: o consumo humano, o abastecimento animal e a irrigação da agricultura”, explica o pesquisador.
Ao todo, o Rio São Francisco passa por 506 municípios durante seu curso, incluindo Pernambuco e os estados de Alagoas, Bahia e Sergipe. Segundo Neison, a água contaminada pode chegar até a foz do São Francisco, na cidade alagoana de Piaçabuçu. Petrolina, no Sertão pernambucano, e a cidade baiana de Juazeiro, seriam afetadas, segundo o pesquisador.
Em boletim divulgado nesta terça (29), o Serviço Geológico do Brasil e Agência Nacional de Águas (ANA) informam que a lama está se deslocando em velocidade menos que a velocidade normal da água e que a previsão é de que ela chegue ao Rio Paraopeba na quarta-feira (30). Apesar disso, por causa da dispersão dos materiais, não é possível prever o dia em que a água chegaria à Usina Hidrelétrica de Retiro Baixo.A Fundaj realiza um trabalho de busca de soluções para o tratamento da água contaminada pelos rejeitos. “Não podemos ter incertezas falando do Rio São Francisco, que afeta desde o grande produtor ao pescador, que está em grande situação de vulnerabilidade social. A contaminação vai acontecer, mas precisamos pensar em metodologias para lidar com isso. Um filtro para metais pesados nas estações de captação de água dos municípios é um exemplo”, diz Neison.
O estudo é realizado pela Fundaj, em Pernambuco, em conjunto com a Universidade Federal de Campina Grande, na Paraíba; a Universidade Federal de Alagoas e a Universidade de Toulouse.
“Não é que a lama vá chegar, mas contaminantes devem ser distribuídos nos recursos hídricos. O desastre não acabou, ele está em curso”, afirma o pesquisador.
Com o satélite usado pelos pesquisadores, além das imagens, é possível detectar regiões térmicas e outros aspectos que o olho humano não consegue ver.
“A mancha da lama é uma, mas a contaminação vai muito além. É na vegetação, nos corpos hídricos e no solo. Agora, o momento é de emergência, de ajudar as vítimas. Virão tempos de acomodação dos resíduos e depois, contaminação. Os metais pesados afetam muito os animais mamíferos. Humanos podem, por exemplo, desenvolver diversos tipos de câncer por causa dessa ingestão”, declara.
Os pesquisadores aguardam laudos da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais e do Ministério de Minas e Energia para calcular de que forma os materiais contaminantes podem afetar a bacia do Rio São Francisco.
“É preciso fazer estimativas para adotar metodologias. Precisamos saber a velocidade da contaminação, o volume do material e até mesmo quais materiais estão presentes nessa lama”, afirma.
Respostas da Chesf
Em entrevista à imprensa pernambucana, na segunda-feira (28), o presidente da Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf), Fábio Alves, afirmou que a chance da lama chegar no Vale do São Francisco seria nula. Questionada pelo G1, a empresa disse que se pronunciaria por meio de nota.
O documento diz que a Chesf “vem monitorando, com toda atenção, a propagação dos rejeitos da barragem de Brumadinho” e que a diretoria “está em contato direto com as entidades competentes de Minas Gerais e do Governo Federal, inclusive com a Agência Nacional de Águas (ANA)”.
Ainda no texto, a Chesf afirma que “as providências estão sendo adotadas para minimizar os impactos no Rio São Francisco”. A companhia diz, também, que informações adicionais sobre o assuntos podem ser repassadas pela Eletrobrás. A reportagem entrou em contato com a Eletrobrás e aguarda resposta.
Por meio de nota, a ANA informa que “consolida anualmente o Relatório de Segurança de Barragens (RSB), a partir de informações disponibilizadas pelos órgãos responsáveis pela fiscalização de barragens”. No caso da barragem de Brumadinho, o responsável é a Agência Nacional de Mineração (ANM), que, em 2017, não a classificou como crítica.
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